sábado, 26 de janeiro de 2013


Aqueles que fizeram parte de nossa vida, nos transformam e são transformados. Como dizia Saint Exupéry: 
" Aqueles que passam por nós não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós"






Imagem do site: www.orkugifts.com (Google Image)



A minha querida tia




Parece que foi ontem, mas muito tempo já passou.
Você esteve presente em quase todos os momentos da minha infância e juventude. Sua presença em minha casa e em meu desenvolvimento foram uma constante. Sim, falo de ti, minha querida tia e madrinha, Wanda. Lembro-me do seu rosto sempre alegre, os grandes olhos verdes quase azuis, sorrindo mesmo trabalhando incansavelmente. E como trabalhaste nas décadas de 50, 60!  Fato de que só quando me dei por gente pude analisar com precisão. Quantos vestidos e outras peças maravilhosas costuraste no silêncio do seu quarto até altas horas da noite para complementar o baixo salário do seu marido e para garantir o sustento de seus filhos.
Assim foste levando sua vida sem medo, com coragem e determinação não agradando a todos com certeza, pois no impetuoso afã de ajudar, acabava sendo incompreendida.  Aos poucos, foste conseguindo realizar seus sonhos. Aprendi a amá-la e respeitá-la ao longo dos anos de convivência, lembro-me nesse instante das tardes de jogos de mesa que compartilhamos, da sua ajuda e apoio a minha família no momento de enfermidade. Da amizade sincera com seus dois filhos, verdadeiros irmãos, sempre tão próximos em todos os instantes de alegria ou de tristeza.
Recordo-me também dos momentos de adversidades que sofremos, dos desentendimentos entre nossa família e a força das circunstâncias nos separando, privando-nos da convivência, antes rotineira. As rodas da vida levando-nos como uma imensa cachoeira deixando distância entre nós e o silêncio aterrador. Por que razão nos afastamos de pessoas tão próximas e especiais como você? Não sei responder, só sei que houve uma grande lacuna em nossa amizade tão pura e sincera agravada pela distância, sem a convivência de antes.
Depois passamos a nos falar em alguns momentos... Breves momentos de dor e luto familiares ou em alguma visita fortuita, em algum Natal distante...
Vieram as tristezas em sua vida senil, a morte do companheiro e do filho mais velho levaram alguns anos de sua vida, problemas insolucionáveis com outros filhos e você ali, firme na luta de conseguir resolvê-los como um ser superpoderoso, ferindo-se sem se importar, esquecendo-se do adiantado do tempo que já pintara seus cabelos.
Foi um fardo muito pesado para seu corpo cansado a despeito de tanta disposição de ânimo. Por isso quando me ligaram dizendo que estavas gravemente enferma num quarto de hospital jamais acreditei que poderia nos deixar e não quis acreditar quando disseram que havias  partido para sempre...
Minha querida tia e madrinha: na vida há mistérios que nós, simples e ínfimos mortais nunca poderemos decifrar, porém digo-lhe que sua alma finalmente terá o descanso merecido, pois alcançaste a glória do soldado que morre na batalha. Não perdeste a guerra, tenha certeza, da dimensão onde te encontrares, a semente que plantaste há de mais cedo ou mais   tarde germinar, crescendo  e se tornando uma árvore sólida.