quinta-feira, 20 de junho de 2013

Finalizando a narrativa, 3ª e última parte de Eurico, o presbítero...




EURICO, O PRESBÍTERO  - ÚLTIMA PARTE


É incrível a semelhança desta narrativa, ou da sequência de ações do romance com os filmes atuais de aventuras, aqueles mais cabeludos e inverossímeis, mas que entusiasmam e exaltam um herói, tornando-o quase um super-herói com poderes extraterrestres. 
Após conseguir desvencilhar-se dos árabes, Eurico que os detinha em luta para favorecer a fuga de Hemengarda, agora consegue fugir e ir de encontro à mulher amada sendo seguido à distância pelos cavaleiros inimigos. Alcançando-a, vê que ela estava em estado de choque com todos os acontecimentos e que no torpor em que se encontrava tenta o suicídio tentando se atirar em um profundo abismo onde havia uma ponte improvisada com um imenso tronco de árvore que tombara sobre ele. Uma cena típica de um Indiana Jones da era clássico-romântica, onde o herói toma a mocinha em seu cavalo maravilhoso e atravessa fantasticamente o abismo,  logo em seguida acompanhado pelos três cavaleiros góticos chegando finalmente à grande floresta onde se ocultava o esconderijo de Pelágio. O ponto alto da ação é quando os soldados árabes começam a atravessar o abismo e são surpreendidos pelos godos que serram o imenso tronco fazendo com que se precipitem na imensidão infinita!
Quanto a Hemengarda, já a salvo no esconderijo, é possuída de febre alta, tem visões com Eurico que julgava morto, mas que está a seus pés velando-lhe o sono, o que era verdade, e o irmão da moça, agradece o desvelo do guerreiro o que permite que continue a batalha em defesa dos godos. Apesar do esforço, Pelágio usa estratégias que acabam por derrotá-lo na batalha contra os árabes.
Quando finalmente Hemengarda toma consciência, verifica que suas visões eram verdadeiras, tratava-se mesmo de Eurico em pessoa que está a seu lado e que retira o elmo para que ela o reconheça. Emocionada, pede-lhe perdão por ter cedido às vontades de seu pai e não ter acompanhado seu amor.  Porém, como em todo romance romântico os amores são impossíveis e culminam em grandes tragédias, Eurico revela seu grande drama: o sacerdócio a quem dedicara toda a sua vida, ficando entre o juramento a Deus e o amor carnal. Revelando a sua condição de presbítero a cujos laços estava envolvido e era impossível renunciar, abandona a amada que enlouquece.
Como um robô, retorna a sua vestimenta, elmo, armadura e retorna à luta contra os árabes, deixando propositalmente que o matem. Antes de morrer, entretanto, gloriosamente acaba com os principais traidores da Espanha.
O que é muito importante conhecer de fundo histórico deste romance é a verdadeira razão de guerra entre árabes e godos. De cunho eminentemente político-religioso, Cristianismo contra islamismo, estas púnicas usavam a religião como forma de domínio das massas o que lhes rendia expansão de territórios, o que corrobora o fato de que as religiões de maneira geral pregam um Deus e a união dos povos, todavia causam morte e discórdia no mundo, revelando-se na verdade como detentoras de poder.
Uma característica constante de tendência romântica é a descrição da natureza e o amor platônico idealizado e nunca concretizado pela mulher ideal, linda, angelical e perfeita. O patriotismo também está presente em renúncias do amor carnal pela religião e pela Pátria.
As personagens seguem as características românticas, ou são boas ou totalmente ruins, ou são íntegras, ou corruptas.
O tempo é linear (cronológico). O uso da mitologia nórdica aparece na fala dos godos, como a citação de Odin (o deus principal dos godos), assim como há citações de elementos da cultura árabe, como Maomé e Meca, cidade da Arábia Saudita considerada sagrada pelos muçulmanos.
As reflexões de cunho filosófico são magníficas e impecáveis do ponto de vista estético, eis algumas delas:

"Haverá paz no túmulo? Deus sabe o destino de cada homem. Para o que aí repousa sei eu que há na terra o esquecimento!"

"Eu amo o sopro do vento, como o rugido do mar:
Porque o vento e o oceano são as duas únicas expressões sublimes do verbo de Deus escritas na face da terra quando ainda ela se chamava caos. Depois é que surgiu o homem e a podridão, a árvore e o verme, a bonina e o emurchecer"

"Sabeis o que é esse despertar de poeta: É o ter entrado na existência com um coração que transborde de amor sincero e puro por tudo quanto o rodeia e ajuntaram-se os homens e lançaram-lhe dentro do seu vaso de inocência lodo, fel e peçonha e,depois rirem-se dele. É o ter dado às palavras virtude, amor, pátria e glória uma significação profunda e, depois de haver buscado por anos a realidade delas neste mundo, só encontrar aí hipocrisia, egoísmo e infâmia"

ALGUNS VOCÁBULOS UTILIZADOS NA NARRATIVA:

1- franquisque- antigo machado de luta introduzida pelos francos na Idade Média e que se divulgou entre os povos germânicos nas guerras.
2-lódãos- Planta da espécie nenúfar.
3-Sícera- cidra, bebida inebriante.
4- Elípia- espécie de seda de lã que os godos haviam tomado da cavalaria romana.
5-celtiberos- povos da antiga Espanha.
6- Castros- campos ou fortificações pré-romanas.
7- Emérita- hoje Mérida, capital da antiga Lusitânia romana.
8-almadraque- almofada, coxim.
9-Atanagildo- rei visigótico (período ariano 544 D.C)
10-Ataúlfo- outro rei visigodo - 410 e 415 D.C.
11-Átila- rei dos Hunos - 453 D.C.
12-Leovigildo- rei godo da Espanha.
13-Vítiza- rei dos visigodos da Espanha de 695 a 710.
14- califa- governante árabe com poderes religiosos.
15- Maomé- líder religioso árabe de formação judaica, fundador do islamismo.
16- Odin- divindade mitológica que rege a guerra, a poesia, ciências e as artes para os godos.
17-Opas - arcebispo de Híspalis, traiu a Espanha no século VII.
18- Tárique- general berbere, tenente de Muça.
19- berbere- povo do norte da África.
20- Zohair - célebre poeta pré-islâmico.
21- simum- vento quente que sopra do centro da África em direção ao norte sendo capaz de provocar grandes tempestades de areia.