Parte II
Retomando o comentário a respeito
do livro de Francisco Marins, Território
de Bravos, algumas considerações
são necessárias a respeito dessa sofrida profissão de seringueiro, na verdade,
um quase subemprego para os nordestinos, que em massa, partiram para as terras
inóspitas do Acre para extração do látex e a sua comercialização tirando dali o
sustento de sua família, sendo, por muitas vezes roubados pelas balanças dos “aviadores”
e deles dependendo para sua sobrevivência. À mercê dos perigos da floresta
revelados em febres palustres, ataque de insetos, cobras e animais selvagens,
sem o conhecimento necessário para aplicar uma tecnologia que facilitasse e
garantisse seu trabalho ao longo do tempo, esse trabalhador viveu na lida de extração rudimentar,
sem exercer a devida preservação da natureza, numa busca insana pelas árvores que a mata
fornecia, aprofundando-se cada vez mais na floresta, dando fim a própria vida
em inúmeros casos.
Num país como o Brasil onde nunca
houve por parte de administradores e homens públicos interesse em constituir um
povo estudioso, bem formado e capaz em suas profissões, milhares de
trabalhadores, perdem-se num trabalho repetitivo, sem objetivos, ou sequer
perspectivas de crescer intelectualmente ou profissionalmente. É nesse instante
que surgem povos estrangeiros que levam nossos produtos, formam pesquisadores,
cientistas biólogos e tantos outros profissionais enriquecendo e levando
divisas que poderiam ser nossas, infelizmente, esse descaso é uma constante
dessa nação chamada Brasil.
Seringueiro extrai o látex da seringueira (bemvindocicloturista.com.br)
A vida do seringueiro não é nada
fácil: as árvores são esparsas, a floresta é difícil e perigosa e os
instrumentos de trabalho necessários para a extração do látex são: espingarda
(para proteção), machadinha ou facão, terçado, tigelinhas e baldes de folha
para armazenamento, além de outros.
Ferramentas do seringueiro - espingarda, facão ou machadinha, terçado, tigelinha, balde e outros utensílios.
Após a extração do látex, o seringueiro passava num processo rude e artesanal à sua defumação, fazendo com que coagulasse enrolando-o num pedaço de pau, produzindo grandes bolas de borracha que iam entre 5 e 10 kg. Muitos desses trabalhadores acabavam contraindo a tuberculose, fatal em vários casos.
A coagulação do látex (http://g1.globo.com)
Após esse processo encaminhava-se
aos barracões para vendê-lo. Como era autônomo, dependia desses “aviadores”
(proprietários dos barracões) e ficava à sua mercê para sobreviver.
Deixando de lado a pena que nos causa essa humildade e inércia imprestável ao progresso, por vezes,
há um ímpeto de aprovação na atitude estrangeira em levar nossa matéria-prima, uma
vez que nesses países há um espírito de trabalho e investigação que resultam em
invenções em benefício de toda a humanidade. Tivesse a borracha ficado apenas
no Brasil, tenham a certeza de que ela estaria extinta e nem pneus fabricados
teríamos, tanto é que o mal das folhas, uma doença que acometeu os seringais posteriormente nunca foi pesquisada, a não ser por um
botânico de nome Jacques Huber, diretor do museu Emílio Goeldi, entretanto,
após sua morte, nada mais se fez. A preguiça mental e a falta de interesse no
estudo é uma constante aqui no Brasil, um gigante sem força, dado a costumeira
inércia de sua população. Na história do ciclo da borracha no mundo, em 1820,
ela passou a ser usada na fabricação de capas impermeáveis e pouco mais tarde,
o americano Charles Goodyear descobriu através seus incansáveis estudos a vulcanização que nada mais é do que a
mistura do produto com enxofre e alvaiade,
tornando-a elástica e resistente, servindo na época para a utilização em
vestimentas, ou para envolver rodas de carruagens (meio de transporte) e carros
na Europa. Mais tarde, em 1888, o também americano Dunlop inventou o pneumático.
Quem já viajou, ou habita a
região norte e seus estados e territórios têm conhecimento das terríveis febres
palustres que podem levar à morte.
O personagem principal do livro, cujo autor
deseja exaltar, é José Plácido de Castro, um gaúcho de origem humilde da cidade
de São Gabriel. Para tanto, utiliza a narrativa retrospectiva para a descrição dos
capítulos, numa técnica que mescla passado e presente prendendo a atenção do
leitor.
No início, introduz o personagem
já adulto e na região acreana, acometido por perigosa febre palustre em estágio
bastante avançado. Praticamente em meio à morte, ele vai relembrando toda a
trajetória de sua vida em um delírio ocasionado pela doença.
O interesse de Plácido pelo
território do Acre inicia-se na escola primária quando a professora começa
mostrar à classe a imensa riqueza das florestas e seus perigos. Nesse período,
perde o pai, fato comunicado por um vizinho, quase um estranho, que vem
buscá-lo na escola. Desta forma, torna-se órfão e tendo que enfrentar a miséria
econômica da família, fato que o obrigou como filho mais velho a abandonar os
estudos na escola matutina para trabalhar como balconista-vendedor em uma loja
de tecidos, passando a frequentar uma escola noturna, e fazendo as lições e
estudos suplementares nas horas de folga. Passado algum tempo, o mesmo estranho
que o buscara na escola por ocasião da morte do pai lhe oferece ajuda,
prometendo custear seus estudos secundários em uma escola melhor, ao que
aceitou prontamente.
Infelizmente não pôde continuar
os estudos na nova escola, pois a mãe e os irmãos passavam por necessidades
financeiras, vivendo na miséria, assim se emprega como aprendiz de ourives para
poder sustentá-los.
E a partir deste momento, Plácido
revela-se um homem impetuoso e destemido cujo maior sonho persiste em se tornar
um militar.
Será um imenso prazer receber um comentário seu sobre o assunto relatado. Clique no link Comentários (abaixo) para fazê-lo.